late night talking

“Hyomin, chegou uma carta para você.”

Havia uma grande interrogação na expressão da garota quando se virou na direção da sua mãe. Entretanto, não foi necessário questionar quem diabos tinha lhe enviado uma carta àquela hora, já que o carimbo do gabinete do Kage estava estampado em sua frente. Num pulo, Hyomin ficou de pé e se aproximou, tomando o recado das mãos de sua mãe e abrindo-o com um toque de ansiedade. Nunca tinha sido convocada tão tarde. Seria uma missão especial?

Se fosse o caso, gostariam de dar a notícia pessoalmente, pois, na carta, não havia nada além de uma convocação imediata até o gabinete. — Tsc. Nem para dizerem do que se trata. — Resmungou, indo até sua cama, onde estava lendo quadrinhos, antes de sua mãe interrompê-la. Juntou seus pertences, colocou-os de qualquer maneira na estante que havia em seu quarto — organizada numa ordem que apenas Hyomin entendia, que misturava ficção com livros didáticos —, e começou a se arrumar. Vestiu seu uniforme, perfeitamente engomado graças à sua mãe, verificou seus equipamentos e os colocou dentro da bolsa ninja. E, após uma breve checagem, deixou seu quarto.

— Boa noite, mamãe! Boa noite, papai! — Gritou, enquanto caminhava até a saída de sua residência. Ouviu o murmúrio de seu pai, mas, estava com muita pressa para dar-lhe atenção. Provavelmente, se tratava de algum pedido para ela se sair bem. Esse era o “boa-sorte” que seu pai sempre lhe desejava. Falhar nunca era uma opção para ele; ele tinha plena confiança de que Hyomin ou seria boa, ou seria ótima — sendo que, nem ela própria confiava tanto assim em si mesma.

As ruas estavam ligeiramente vazias naquele horário, o que permitiu uma caminhada rápida até o prédio onde as atividades ninjas aconteciam. Ao chegar, entretanto, parou diante da entrada.  E já esperava há alguns minutos, quando a silhueta conhecida de Naga apareceu em seu campo de visão. — Pontualidade é uma bênção… Que você não parece ter. — Ele não estava tão atrasado assim, mas, nenhum dos dois parecia disposto a perder a oportunidade de se alfinetar.

— Dessa vez, sem nenhuma decisão estúpida de se jogar no meio dos inimigos, certo? — Provocou de volta, seguindo-o pelo prédio. Mesmo durante à noite, o lugar continuava cheio de pessoas indo de um lado para o outro; kirigakure inteira poderia estar indo dormir naquele horário, mas, seus ninjas não. — Não sei o que vai ser… Mas, desde que não tenham homens-lagosta envolvidos, vamos estar no lucro.

Não foi uma caminhada demorada. Chegaram rapidamente até o gabinete, e Naga logo já foi entrando. Nem uma batida antes, para avisar a respeito de sua chegada. Hyomin certamente teria que lhe ensinar bons modos. — Boa noite! — Exclamou, tentando passar um ar mais educado que seu companheiro. — Sou Nara Hyomin. Fomos convocados e estamos prontos. — Assim como estava extremamente curiosa para saber do que se tratava. Tão curiosa que, antes mesmo que lhes contassem o motivo daquele chamado, ela já analisava a sala, seus presentes e suas expressões, tentando adivinhar se era algo muito sério.

país da água, inverno de 1245, gabinete de kirigakure no sato, que se encontra na companhia de naga, para missão rank C.

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Após mostrarem a convocação, ambos os genin foram acompanhados numa rápida caminhada através dos corredores do prédio para uma área que, ao menos para Hyomin, era desconhecida. Ao alcançar uma porta e indicar que entrassem, o mais velho parou solenemente junto à entrada, fazendo a Nara pensar que, seja lá o que havia ali dentro, era muito importante. — Obrigada. — Murmurou baixo, ao passar pela figura masculina.

Hyomin entrou suspeitando que encontraria alguém importante. Seria o próprio Mizukage? Não imaginava ele se dando ao luxo de ter reuniões com genins tarde da noite. Analisou a sala, absorvendo seu aspecto soturno; era uma sala comum de reuniões, porém, a iluminação mínima e a falta de pessoas ocupando suas cadeiras passavam uma sensação solitária. Não era o tipo de lugar que Hyomin frequentaria por livre e espontânea vontade.

Contudo, parado no final da sala, tão imóvel quanto todos os demais móveis, estava alguém que, certamente, a garota não esperava encontrar. Não sabia o que um membro dos Sete Espadachins poderia querer com ela, porém, era com um deles que trocava olhares. Kishou Arima, o portador de Nuibari. Seu pai costumava chamar a arma de “aquela agulha de costura maldita”, pois era uma lâmina fina, com um fio de aço preso em seu punho, que realmente lembrava o objeto trivial — com a diferença mínima de perfurar corpos em vez de tecidos.

Hyomin nunca a tinha visto, além das imagens em livros. Também não conhecia o homem que a empunhava pessoalmente. Mas, seu pai também tinha uma opinião formada sobre o Kishou; assustador. Sua expressão neutra apenas servia para esconder uma força absurda, e uma personalidade caótica e sedenta por justiça. Realmente estava tendo dificuldades para entender o que alguém como ele iria querer com ela, ou Naga. Sabia que sua inteligência e ascendência estrangeira era um chamariz aos olhos dos mais velhos, contudo, a coisa mais relevante que se lembrava de ter feito em prol da vila era ter visto com os próprios olhos as paladinas — ou homens-lagosta, como Naga insistia em chamá-los.

Inclusive, falando em Naga, este encarava a figura com a cara mais abobalhada possível. — Boa noite, Kishou-sama. Sou Hyomin Nara, e estou às suas ordens. — Murmurou, tão calma como a expressão que julgava ter botado em seu rosto. Esperava que sua voz pudesse tocar Naga, que parecia um pouco perdido. E, claro, desejava ardentemente que aquele homem não estivesse ali pra os punir, por qualquer motivo que fosse. — Por um acaso, estamos encrencados?

Ainda encarava o homem quando sentiu a leve cotovelada em seu braço. Desviou os olhos na direção de seu companheiro, encarando Naga de esgueira. Certamente não era o momento de consolar e, caso o fizesse, o Espadachim estaria ali, analisando-os. Julgando-os. Mesmo assim, notando o brilho de nervosismo nos olhos jovens, Hyomin esticou sutilmente seu braço, tocando com as mãos o punho do rapaz. Deslizou seu indicador para a parte interna do membro, esfregando a ponta de seu dedo contra a pele de Zunma, tentando tranquilizá-lo. Sua mãe costumava chamar a área de linha da calma e, quando corretamente pressionada, diminuía sintomas de ansiedade e trazia mais serenidade para o pensamento e respiração da pessoa.

país da água, inverno de 1245, gabinete de kirigakure no sato, que se encontra na companhia de naga, para missão rank C.

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Com o avanço do espadachim na direção do mapa, Hyomin se aproximou, também, consequentemente, fazendo Naga se aproximar junto, uma vez que ainda segurava o pulso do rapaz. Encarou o mapa, franzindo o cenho à medida que ouvia as palavras de Kishou. Que negociação suspeita era essa? Com quem ela tinha sido realizada? Tinha a ver com a guerra? Se sim, por que diabos estavam mandando genins, quando sabiam que, possivelmente, seria uma missão para uma patente mais alta?

Sua curiosidade iria lhe matar. Entretanto, manteve a boca calada. Com muito esforço, claro.

Soltou Naga, assumindo uma posição reflexiva ao cruzar os braços e encarar o mapa. Deveria memorizá-lo, certo? Ao menos, isso não seria nenhum problema para a garota. Agora, como ela iria fazer para conseguirem cobrirem o caminho escolhido sem muitos infortúnios, não sabia… Quer dizer, uma ideia começava a se formar em sua mente, mas, isso dependeria muito do que iriam trazer — informação até então oculta pelo homem.

Ainda memorizava o caminho quando ouviu que o acordo poderia não ser verdadeiro. — Então, podemos estar sendo enviados para uma armadilha? Entendi o motivo de estarem usando genins. Não podem se dar ao luxo de perder ninjas de alto escalão com uma guerra tão próxima. — Seu tom era neutro; não havia se ofendido com a tarefa, embora não gostasse de saber que era tão descartável. Mas, provavelmente, aquela era a decisão mais sábia. Tinha certeza que sei pai a aprovaria. Na verdade, seu pai fácilmente estaria por trás daquele plano, se pudesse.

Afastou-se um passo da mesa ao concluir a memorização do mapa. Seus braços, porém, continuavam cruzados. Com certeza iria aproveitar a abertura para perguntas que Kishou ofereceu. — Temos permissão para, ao menos, sabermos que tipo de mercadoria vamos transportar? Seria bom ter uma ideia do que pode estar nos aguardando, para montarmos um plano previamente.

país da água, inverno de 1245, gabinete de kirigakure no sato,  na companhia de naga, para missão rank C.

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Hyomin assistiu o mapa se queimar, até que não sobrasse mais nada. O espadachim não estava mais ali; sumiu entre um piscar de olhos. — Se o acordo for falso, na melhor das hipóteses, nós morremos. — Falou para Naga, embora seus olhos ainda pairassem sob as chamas. — Se for uma armadilha, não vamos voltar. Irão nos usar para conseguir informações e, quando perceberem que somos inúteis, vão nos matar.

Seu pai havia lhe contado sobre os horrores da batalha desde quando era apenas uma criança. Hyomin foi forjada na mais sincera e, por vezes, cruel, honestidade. — Sim, vamos. — Girando sob os calcanhares, seguiu o rapaz para fora da sala. Ao sair, não esperou pelo guarda que os trouxera até ali; agora, sabia muito bem o caminho. — Não precisa se desculpar. Você é bom espadas, eu sou boa com planos. Acho que é por isso que estão nos colocando em missões juntas. E, sim, já pensei em algo.

Hyomin se aquietou durante a caminhada até a saída do prédio. Apenas ao sentir a brisa gelada e habitual das ruas de Kirigakure que sua voz se fez ouvida mais uma vez. — Você confia em mim? — Repetiu a pergunta que fez há alguns dias antes de explodir parte do barco em que estavam. Gostaria que a resposta continuasse sendo sim. — Eu escolhi um caminho, porém, não irei dizer qual. Você sequer conseguiu memorizar, então, não faz diferença saber. Sobre o plano, existem partes. A primeira é durante a ida; seremos genins que estão procurando o animal de estimação da esposa de algum nobre. Um gato; eles sempre têm um.

— Não precisamos saber a quem o gato pertence, genins são a ralé dos ninjas, é normal não nos passarem informações. E também é normal nobres serem mesquinhos e darem prioridades para alguma missão estúpida, como o resgate de um gato, em vez de algo mais pertinente ao momento… — Não parou de caminhar durante nenhum momento, até alcançar a entrada da vila. Olhou para Naga, as sobrancelhas crispadas. — Por enquanto é isso. Apenas seja genin burr… Apenas seja você mesmo, que não vamos ter muitos problemas. — Deu os ombros, e voltou a encarar o caminho à sua frente.

E, então, disparou noite adentro, correndo na direção do caminho escolhido por ela; o primeiro, contando da direita para a esquerda. A segunda rota era mais curta e poderia ser utilizada por outras pessoas, como comerciantes e viajantes, por ser mais rápida. A terceira era muito mais longa, o que aumentava as chances de se exporem a perigos desnecessários. Mas, Hyomin jamais tinha andado por nenhuma delas, então, tinha que confiar em sua dedução.

país da água, inverno de 1245,  na companhia de naga, para missão rank C.

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— Confesso que estou bem surpresa por Arima-san ter nos passado a missão. Será que esse minério servirá para produzir alguma espada? Ou melhorar alguma que já existe… — Refletiu sobre os Espadachins da Névoa; eram o grupo de shinobis mais forte que Hyomin conhecia. — Se voltarmos vivos. — Corrigiu; ainda tinha suas ressalvas a respeito daquela missão e, sempre pensaria no pior — ser otimista não iria preparar sua mente para enfrentar quaisquer dificuldades.

Hyomin sorriu para os guardas, envergonhada, quando Naga a cutucou. Ele era sempre tão barulhento e animado, enquanto ela era apenas uma presença taciturna, geralmente preguiçosa demais para acompanhá-lo. Eram uma dupla esquisita, de fato, mas, de alguma maneira, pareciam se completar. — Nossa autorização? Bem… — A conversa com Arima tinha sido tão objetiva que rápida que a kunoichi sequer se lembrou do documento que permitiria sua saída da vila. — …Então… —

Por sorte, enviaram uma ave com a autorização, que chegou a tempo de evitar que levassem um grandíssimo esporro por não portarem nenhum documento. Liberaram a passagem, e Hyomin apertou o passo, como se fosse possível mudarem de ideia. — Você está agindo como se fosse uma estrela. — Murmurou, num tom leve que indicava ser uma brincadeira. — Talvez estejam pensando em entrevistá-lo, já que não é qualquer um que sobrevive ao Homem Lagosta.

Iria caçoar dele pelo resto da vida dos dois.

Mas a piada se dissipou rapidamente, e logo a kunoichi voltou a focar no que era importante. A missão. — Bom, na teoria, sim. Eu decorei o caminho do mapa. Eu sei a direção que temos que seguir, mas, não sei exatamente o que vamos encontrar no caminho. Você já fez alguma missão por aqui? Se lembra de alguma coisa que poderia nos colocar em perigo? Nem Arima quis saber o caminho escolhido, seria bom nos preparar para qualquer coisa.

E, de fato, Hyomin tentava se preparar. Enquanto seguiam, sua atenção dividiu-se em dois focos: manterem-se na direção correta, e ter a certeza de que não estavam sendo seguidos. Seus olhos e demais sentidos estavam trabalhando para avisarem-na de qualquer indivíduo que estivesse por perto, principalmente se fosse alguém que não quisesse ser visto.

país da água, inverno de 1245,  na companhia de naga, para missão rank C.

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Hyomin estava certa ao dizer que conhecia o caminho apenas na teoria. Na prática, era muito difícil segui-lo, principalmente à noite, quando árvores poderiam facilmente ser confundidas, assim como pequenas trilhas que apareciam pelo caminho. A Nara, eventualmente, percebeu que haviam se perdido, o que impediu que se afastassem demais da direção correta, entretanto, era um erro que não deveria ser cometido, devido a urgência da missão.

— Antes a gente tivesse tomado o caminho mais longo. — Resmungou, mal-humorada, para Naga, enquanto observava ao redor. Estava brava consigo mesma. Entretanto, suas lamúrias não se estenderam muito; um vulto, passando de uma árvore para outra, chamou sua atenção. Seus olhos se arregalaram, e seu corpo inteiro entrou em um estado de alerta. — Não estamos sozinhos. — Diria, o mais baixo possível, para seu companheiro. — Mas, também, não estou vendo mais nada. Fique de sobreaviso.

Continuaram a seguir. Após aquele avistamento, Hyomin não deixou a cautela de lado e, mesmo com a irritação de ter se perdido, continuou com seus sentidos cuidadosamente voltados ao ambiente. Passaram-se horas sem nenhum outro acontecimento e, o sol começava a despontar no horizonte. A iluminação acalmava seu coração e seus olhos — estes, que ainda não descansavam. Estes, que localizaram, um pouco mais à frente, outro movimento.

Olhou para Naga. Chamou a atenção do rapaz com um estalo de língua. “Companhia”, diria, sem nenhum som, para que ele lesse seus lábios. “Ali.” E apontou na direção em que vira o vulto. Aparentemente, estavam sendo acompanhados há horas. Isso significava que eram alvos de suspeitas. O que, também, significava que provavelmente nenhuma mentira contada por ela poderia salvá-los. O jeito era aproveitar aquela vantagem do jeito que Naga gostava — com ação e violência. “Vamos pegá-lo.”

Com um movimento rápido, enfiou a mão dentro de sua bolsa ninja e tirou duas shurikens, que seriam devidamente arremessadas na direção em que seus olhos viram a movimentação. Que seja apenas um, pediu em pensamento, aflita com a possibilidade de uma batalha em desvantagem.

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